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Entrevista ao Jornal de Folclore

No dia 10 de Outubro de 2009, o Rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde cumpriu mais um dos seus objectivos, através da sua participação activa no afamado "Jornal de Folclore", dirigido pelo Sr. Manuel Barbosa.

A tentativa de divulgar os usos e costumes destas duas povoações e de projectar a nossa associação, passou pela demonstração do arsenal presente no local onde esta se encontra sediada, bem como por uma entrevista na qual se tentou alertar para os problemas vigentes divulgando um pouco da história do grupo, fazendo menção a aspectos relevantes.

Seguidamente, publicamos a entrevista supracitada:



Apenas pouco mais de quatro dezenas de pessoas dão vida aos lugares de Zagalho e Vale do Conde. Como é possível reunir elementos para o grupo folclórico numa região com tão pouca expressão populacional?


De facto, inicialmente, o grupo era constituído, na sua maioria, por elementos residentes nestas duas pequenas aldeias, porém, pela falta de disponibilidade ou pela fatalidade óbvia do tempo, essas pessoas foram abandonando esta associação. Assim, ao longo dos 30 anos de existência, o rancho sofreu momentos de debilidade que conseguiu ultrapassar através da persistência de alguns dos seus constituintes e do apoio prestado por pessoas residentes no restante concelho, cativados pela simpatia e simplicidade das gentes desta região.



Esse factor não é um risco para a continuidade do grupo?

Não. O facto de esta associação ser liderada por pessoas humildes e acolhedoras faz com que todos se sintam bem no seu seio já que, mais do que um grupo de folclore, somos um grupo de amigos e de convívio onde todos, dos 8 aos 80, são recebidos de igual modo… Assim, uma vez que o nosso carácter permanecerá imutável, é fácil de prever uma continuidade duradoura.



Assim mesmo o grupo tem tido aderentes que garantam manter a actividade?

Sim. Nos últimos anos tem-se registado um número crescente de interessados em integrar o Rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde. Actualmente, somos constituídos por cerca de 50 elementos, grande parte deles jovens, bastante empenhados e extremamente activos, que demonstram interesse em participar em todas as actividades desenvolvidas pelo nosso grupo, chegando a integrar, maioritariamente, a sua direcção e trabalhando, conjuntamente, para que este seja reconhecido não só no nosso concelho, mas em todo o país.



Quais eram os principais meios de sobrevivência das gentes desta região?

Sendo as populações destas duas aldeias genuinamente humildes, os principais meios de subsistência estavam, necessariamente, relacionados com o cultivo e com a exploração de recursos existentes no contexto envolvente. Assim, e porque este era um tempo em que o transporte e transacção eram feitos por meio fluvial, muitos destes recursos eram levados na designada “Barca Serrana” e comercializados num contexto inter e extra concelhio, como era o caso da carqueja e da madeira, utilizados para fazer a cama do gado ou para aquecer as lareiras das pensões, os fornos das padarias e até os destinados ao fabrico da “cal parda”, situados na Riba de Baixo e Vale de Tronco. No que diz respeito ao cultivo, estas gentes eram exímias produtoras de cereais, como o trigo, o milho, a cevada e o centeio, que eram posteriormente levados aos moinhos da abrupta Serra da Atalhada para serem moídos e transformados em farinha. Para além disso, era também característica a produção de vinho e azeite e o cultivo da batata e do feijão, bem como o agriculto da planta do linho e a sua transformação até ao fabrico de tecido. Por fim, porque a pastorícia e os produtos secundários que dela advêm tinham um papel fundamental na vida destas povoações, era criado o gado caprino, para além de algum gado suíno e ovino.



 O grupo recria tradições já perdidas?

Sim. Ao longo do ano, o grupo tenta recriar e restaurar as antigas tradições das gentes desta região levando a cabo uma série de iniciativas que inspiram à dinamização e ao convívio. Assim, fazem parte das nossas actividades regulares o cantar dos reis, a comemoração do Domingo da Conta, do dia da Bela Cruz, o assorrear em época de Carnaval, a celebração do dia da Nossa Senhora de Março (em que se rezam as cem Avé Marias), o cantar das Almas Santas e do Aumentar, e não Aumentar, das Almas, entre outras actividades que têm por objectivo a preservação dos costumes relacionados com a agricultura, como é o caso da apanha da azeitona e da uva, em época de vindimas. Para além disto, o rancho recria ainda o ciclo do linho, desde o semear até ao fabrico dos tecidos, e a malha dos cereais, cujo produto é utilizado posteriormente na feitura da broa.



 Quais são os locais de interesse turístico e histórico da freguesia?

As paisagens observáveis destas duas aldeias, são por si só de uma grande beleza, com o verde dos campos e das serras envolventes. No entanto, um dos locais turísticos de maior relevância nesta região é a Serra da Atalhada, que proporciona uma imagem esplendorosa das aldeias e redondezas da região e onde está localizado um importante conjunto de moinhos de vento, onde outrora se moíam os cereais.

Na freguesia de Friúmes, pode também visitar-se a Igreja Matriz em honra de S. Mateus com o seu belo altar-mor em talha dourada. É também de salientar o Rio Alva, ao longo do qual se encontra a praia fluvial do Vimieiro.



 O que faz falta na freguesia de Friúmes?

A freguesia de Friúmes apresenta uma pluralidade de meios passíveis de serem explorados. É necessário fomentar o turismo e promover actividades várias que incentivem a sua visita e, para além disso, a realização de um número maior iniciativas nas quais o grupo possa estar inserido.



 Com que tipo de apoios contaram para a formação do grupo?

O grupo foi fundado em 1979 na sequência da leitura de um artigo, cujo tema era o folclore do concelho de Penacova, que criticava o facto de existir um grande número de associações conotadas de “carnavalescas”. Confrontado com esta situação, o rancho decidiu criar um fiel difusor dos usos e costumes das gentes desta região contando, para isso, com a orientação do Dr. Nelson Correia Borges, antigo docente do Instituto de História de Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, que nos guiou em todas as recolhas desenvolvidas (trajes, danças, cantares, actividades, etc…). Inicialmente, o grupo começou por realizar a “Petição dos Reis” para angariar fundos que permitissem comprar o material necessário para dignificar a associação, porém, uma vez que estes não foram suficientes e os seus constituintes se encontravam entusiasmados com a iniciativa, cada um dos elementos comprou o seu próprio traje e contribuiu para as restantes despesas. Depois disto, algumas pessoas da região, conhecendo o trabalho e a dedicação do grupo, começaram a contribuir monetariamente para o desenvolvimento do mesmo e, assim, seguido de uma avaliação final cuidada por parte do Dr. Nelson Correia Borges, o rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde estava pronto para iniciar as suas actividades.



 Como subsiste economicamente o grupo?

Desde a sua filiação no IPJ e no INATEL que a nossa associação tem sido subsidiada por estas associações, porém, para além destas, também a Câmara Municipal de Penacova e a Junta de Freguesia de Friúmes têm doado alguns contributos monetários ao grupo. Os restantes fundos são conseguidos através da nossa participação em feiras de artesanato por todo o país, bem como outras iniciativas que o grupo desenvolve para esse fim.



 Que tipo de actividades desenvolvem?

Para além das feiras de artesanato e das actividades que recriam as tradições antigas, o grupo leva a cabo uma série de iniciativas, tendo como população alvo a faixa jovem, já que a sua filiação no IPJ o exige. Assim, é nosso objectivo, este ano, realizar acampamentos, descidas do rio Mondego de kayak, corridas, Peddy Pappers, entre outras actividades, que fomentam e incentivam os jovens da região.



 Qual a importância da existência de um grupo de folclore junto das comunidades locais?

Os grupos folclóricos, bem como todas as tradições recriadas pelos mesmos, que faziam parte integrante dos usos e costumes das gentes de cada região, são uma demonstração cultural de importância primaz junto das comunidades. Para além de defenderem uma identidade cultural regional, estas associações transportam e difundem o nome da sua proveniência trazendo, obviamente, uma série de benefícios, desde logo, turísticos. No caso concreto do Rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde, aparte do que foi supracitado, desenvolvem-se, ainda, uma série de actividades e eventos com vista à interacção com as populações locais e à exibição do nosso trabalho, depositando nelas um sentimento de orgulho e de felicidade, e aumentando, assim, a dinâmica destas comunidades.



Foi fácil afirmarem-se ao movimento folclórico nacional?

A afirmação do grupo no movimento nacional folclórico não se revelou de grande dificuldade, o grande obstáculo residiu, precisamente, na obtenção de meios monetários e outros que permitissem a difusão do nosso nome por todo o Portugal. Apesar de tudo, desde a filiação na Federação do Folclore Português que a projecção, e procura, do grupo tem aumentado.



 Quando foi feito o reconhecimento de qualidade ao grupo pela Federação?

O nosso grupo foi o primeiro do concelho a ser aceite pela Federação do Folclore Português como seu membro constituinte, e representante fidedigno dos usos e costumes das gentes desta região. Assim, o reconhecimento de qualidade foi feito quando o Rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde atingiu os 3 anos de idade (1982). Os trajes, danças e cantares foram apresentados ao Sr. Augusto Santos (o presidente da Federação de Folclore Português da altura) e ao Sr. José Maria Marques e foram aprovados muito positivamente por ambos. Ao longo dos anos, o grupo tem sido alvo de sucessivas apreciações e, todas elas, têm sido francamente favoráveis.



 Alguma vez sentiram descriminação ou falta de reconhecimento por parte de organismos ou entidades?

O Rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde tem sido, desde algum tempo, alvo de alguma subestimação por parte das autarquias locais. Falta-nos, assim, algum apoio a nível moral e também a demonstração de uma maior confiança e estima pelo nosso trabalho e pela nossa representatividade já que carregamos, nas nossas danças e cantares, o nome do concelho e das gentes que o habitam.

Prova desta falta de consideração é o facto de, até este momento, não nos ter sido entregue a posse de bens que nos pertencem por direito. No momento da formação do rancho, por exemplo, os moinhos da Serra da Atalhada encontravam-se em completo estado de degradação e, já que a associação necessitava de um museu onde pudesse expor as suas recolhas, decidiu reconstruir dois desses moinhos, com a aprovação do então Presidente da Câmara, o Dr. Artur Coimbra. Depois de concluído esse trabalho, o autarca, na sequência de novas eleições, abandonou o cargo e, os seus seguidores nunca forneceram uma autorização ao rancho para a ocupação e utilização dos ditos moinhos, mesmo depois de numerosos pedidos por carta. O mesmo sucede com a actual “sede” do grupo que, apesar de não estar registada em nome da associação, é, e será, sempre considerada como propriedade do Rancho Folclórico e Etnográfico do Zagalho e Vale do Conde já que, apesar de a sua escritura se encontrar em nome da Câmara Municipal de Penacova, o intuito do seu anterior possuidor era entregar este bem ao grupo e, para além disso, muito trabalho e dedicação das gentes destas povoações, e do próprio grupo, foi empregue para a obtenção do actual estado da propriedade.

É também lastimável que, nesta região onde proliferam os grupos de folclore, se denote uma constante rivalidade entre alguns dos mesmos. O folclore, a nosso entender, representa a difusão de uma cultura e de tradições e não uma disputa em que prevalece a discórdia, onde se trabalha para ver realizado o dano de outros. Somos uma “família” e, como tal, não devemos levar avante este tipo de práticas já que, em conjunto, todos caminhamos para o mesmo fim e com as mesmas ambições.



Têm sentido relutância de outros grupos na aceitação de permutas de actuações?

Não. Os grupos estão sempre receptivos a permutas desde que exista disponibilidade para tal. O que muitas vezes dificulta estas realizações é, de facto, a carência monetária que, obviamente, se traduz na falta de transporte. Apesar de tudo, temos conseguido fazer intercâmbios, aquando da celebração do nosso aniversário e do festival de folclore anual, com grupos de todo o país, alguns deles de renome.



O grupo já esteve no estrangeiro?

Não. Apesar da nossa ambição e do nosso esforço, o grupo apenas conseguiu mostrar as suas potencialidades um pouco por todo o Portugal Continental e também na ilha da Madeira, obviamente, por falta de disponibilidade monetária. Contudo, e esperançados com este novo advento de juventude, a nossa associação trabalhará arduamente este ano para conseguir alcançar esse objectivo, há muito tempo desejado por todos os seus elementos.